quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Estranho (ou Transeunte na avenida)

Quando teus pés cansarem, eu poderei te carregar no colo, como uma mãe a um filho. Quando o teu cabelo cobrir teu rosto, eu poderei guiar os teus caminhos como um bom cão ao seu cego. Quando teu coração parar, poderei eu arrancar o que sobra em mim de emoção para soprar em ti alguma vida. E se ainda assim, não conseguires perceber o mais breve e insólito sentimento, eu correrei para cobri-lo de toda a alma que te falta.

sábado, 27 de outubro de 2012

João

O salto parecia tão grande. E na verdade, ninguém deu atenção ao que estava acontecendo. Nem mesmo ele. Sim, ele que vivia aquela história toda. Ele não sabia o que estava acontecendo de fato. Ignorava o que os outros, os amigos, os amigos dos amigos diziam. Não por maldade, mas apenas por ignorar, por não conseguir compreender o que diziam. E assim foi levando adiante sua pobre vida, sua vidinha, como ele chamava. Sem sequer pensar em dar o salto que pudesse levá-lo a algum outro lugar que não seu lugar qualquer.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A paixão assistida por uma janela todos os dias

Deixe! Deixe eu me apaixonar, deixe. Não é pedir demais. Deixa eu ficar contigo enquanto você olha as fotos que tirou ontem. Deixe eu acender seu cigarro, enquanto você se preocupa com a máquina de lavar ligada. Deixa eu encher sua taça de vinho, enquanto você canta uma baladinha italiana pra nós dois. Deixa eu arrumar seus souvenires num canto da mesinha de centro, para que possamos jantar juntos. Deixa eu secar as suas mãos em minha camisa, antes de comermos alguma coisa. E deixe eu correr minhas mãos sobre seus cabelos e entrelaçar meus dedos em seus fios. Deixe eu roçar minha barba na sua. Deixe eu beijar sua barriga te fazendo rir com as cócegas que só eu sei fazer você sentir. Deixa eu encostar meu corpo no seu, devagarinho, como se fosse encaixar uma peça de quebra-cabeça. Deixa eu mirar seu olhar quando me diz que não devo fazer nenhuma dessas coisas, sabendo que farei, mesmo assim. Deixa eu perceber quando devo mudar de lugar de seu corpo quando você quiser sentir minhas mãos em algum outro canto. Deixe eu fechar seus olhos com uma de minhas mãos e te levar pro seu quarto. Deixe eu fechar a porta pra que seu gato não escute nenhuma de nossas sacanagens ditas entre gemidos. Deixa a comida esfriar no prato porque o universo é só nosso.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Sobre o amor e o mar

E quando vem o medo e a confusão, o coração bate mais forte que o costumeiro. E a sensação é de perder algo que nunca foi seu. E de estar dando um ponta-pé no mundo inteiro. Mas levando uma ferida amarga sobre a língua, que nem uma palavra sequer pode falar pois está presa embaixo de toneladas de remorso. E de amor e ódio. E de rancor e piedade. E de tesão.

Quando a vontade de sonhar é maior que a realidade que cerca. Quando as imagens aparecem sem foco e sem sentido. Como se vivesse num barato de um alucinógeno. Aos poucos vai acalmando, mas não passa.

Coração batendo, tá fingindo que não tá.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O ósculo

Beije-me. Vamos! Beije-me, agora! Minha boca tem sede de você! Tal como a história da corsa ou da terra seca que necessita de chuva. Então? Beije-me, com todos os beijos de tua boca. É só o que desejo em meio a essa noite fria, nessa capital fria, com almas perambulantes... Frias. Tão esquisitas que suas sombras parecem não ser de seus corpos. Não fuja de um simples pedido. Venha, como um vampiro sugar minha seiva de vida.

Onde estás tu que não percebes meu calor, morfina para tuas dores? Não sente que, ao aproximar-me, ficas arrepiado? Estou perto, cada vez mais perto. Posso sentir tua respiração quente em cima de meus lábios. Desvia um tanto de teu olhar. Abrace quem te espreita de muito perto.

Agora sentes? Fecha teus olhos e quero que possa me sentir tocar teus lábios. É a minha língua umedecendo-os. E agora que minha barba, ainda por fazer, arranha teu rosto, teu pescoço, teu peito e barriga? Deseja-me o suficiente para um beijo? Apenas um beijo, é o que peço. Não quero teu corpo por inteiro, nem tuas mãos me tocando, nem teu sexo. Quero um beijo. Uma única prova de como somos iguais. Isso. Agora mais perto e mais perto e mais perto. Já posso senti-lo tão dentro de mim, com tua língua a roçar a minha. Agora mais ainda.

Posso imaginar que tu me desejas? Não por acreditar que me sentirei melhor. Mas por acreditar que tu te sentirás melhor assim. Pronto. Já percebes que assim me tens nas mãos? E que podes fazer o que quiseres comigo? Era o que gostaria de provar-te. Vamos, solte-me. Deixa que eu siga meu caminho. E se quiseres, chama-me.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Sem Título (Segredos)


Contava agora os seus segredos para outro homem. Um homem que não era o seu. Sentiu falta do colo de outros dias. O colo que fora seu por tanto tempo, por mais de quinze anos. Uma fraca lágrima surgiu em seu olhar e ele foi incapaz de impedir que ela se derramasse pelo seu rosto. Limpou com um lenço rapidamente, sem deixar que o outro percebesse a tristeza em seu olhar. E na verdade, não queria que ninguém soubesse que ele já não sorria há algum tempo.

Quando Carlos o deixou, ele achava que não conseguiria nunca mais levantar da cama. Claro que era um exagero. Ele conseguiu não só levantar da cama. Conseguiu também sobreviver cada dia que se seguiu. Não fazia a menor ideia de como ele podia realizar todas as tarefas que se propunha a fazer diariamente. No início, mesmo lavar o rosto era quase impossível. E já conseguia, hoje em dia, ao menos cantar alguns versos. Decerto, era uma canção que lembrava a bela história deles dois. E a cada semana, a lembrança tinha menos dor, menos peso, menos amargura.

Um dia conseguiu mudar a lembrança. Já não era a imagem de Carlos cruzando a porta que vinha à sua mente ao cantarolar. E talvez nunca mais seria. Começou a arrumar malas e pôs nelas todas as esquecidas memórias. Deixou na portaria junto com um envelope. Ligou para o dono e pediu que ele pegasse. Este pensou que poderia se tratar de um reencontro, mas recebeu o recado

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

João Alberto e a gaveta de meias

Era segredo. E quem soubesse dele, poderia tê-lo nas mãos para sempre. João Alberto guardava a sete chaves o que não queria que ninguém, além dele mesmo, soubesse. E era muito bem guardado. Jamais tinha comentado com alguém ou escrito em nenhum diário, jamais tinha sequer postado em um blog, aquilo que guardava. Nem pensar alto ele costumava pensar, para que ninguém pudesse descobrir por acaso.

E chegou um dia em que pensava com seus botões sobre o assunto. E João Alberto não quis mais guardar esse segredo com ele mesmo. Não repartiria com ninguém, apenas escreveria num pedaço de papel e guardaria na gaveta de meias. E assim o fez.

João passou anos sem nem lembrar de seu segredo, mas ao escutar novamente uma música que costumava embalar seu sono no passado, lembrou-se da gaveta. Seu segredo nunca tinha sido retirado de lá. Ao reler a própria carta para si mesmo, lembrou-se de como fora feliz, como vivera os melhore momentos de sua vida e o maior amor dela também. E passou a noite cantarolando canções do passado.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Alguém precisava dizer (ou Alex e Bruna)

Porque você achou que nada disso era de verdade. Porque você achou que estaríamos criando ilusões desde que nos vimos pela primeira vez. Talvez seja por isso que nada foi verdade enquanto andávamos de mãos dadas o trocávamos beijos apaixonados na areia da praia ou ainda as juras de amor em bilhetinhos papel cartão. Eu sempre soube que não poderia ser assim, mas você nunca quis me ouvir. Agora que nós já entendemos do que se trata, sim, se trata exatamente da hora em que acenamos sem graça e com olhar encharcado, agora podemos cumprir a promessa de nos deixar quando déssemos conta de que a história acabara de chegar ao fim.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

escorpião

acendeu o último cigarro que encontrou no maço. tomou uma média pra tirar o bafo dos pesadelos. ainda estava acordando. e na mente, ainda podia ver o escorpião caminhando pelo seu corpo. não podia sequer fechar os olhos para um bocejo que voltava a sentir o passeio do escorpião por seu pescoço. e quando abria os olhos não se sentia aliviado por parecer que ainda sonhava. pelo contrário, ficava até desapontado em ser tudo um produto de sua cabeça. o escorpião ia sumindo de sua mente, como qualquer sonho faz depois do despertar, mas ele se esforçava para lembrar. forçava os olhos fechados para que as patas do escorpião não pudessem sair do emaranhado formado com seus cabelos. tentava manter na memória as pinças que numa cena prendia seus lábios e o impedia de falar. pesadelo. sonho. não sabia o que era, de fato. mas queria deixar isso guardado. já no final do cigarro, lembrou de como fizera para se livrar. apenas um sopro e o escorpião mudara de forma. passava a ser imagem, desenho no papel. inofensivo. inofensivo. acordou e no mesmo papel pintado com o veneno do escorpião, enrolou um baseado.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Sem título


Quantos querem os desejos mais internos
Explanar a essência e algo a descobrir

Nunca mais o resumo foi
O meio de aprendermos a novela
E me parece que ela não deseja mais

E quando será que a nova poesia vai surgir?
Se ele nem sequer sabe se vai mesmo ter poesia nessa história
Esqueceu o que queria  dizer no meio dessas palavras

Deixa pra mais tarde essa arte de brincar
Não dá pra saber se vai ser sim ou não.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Tereza

Andava pela areia catando conchinhas
Cada passo deixando marcas
Deixava o cabelo solto ao vento flamular como uma bandeira
A barra do vestido molhada

E ela apenas ia.