Eram sete e meia da manhã e ela não acordara, porque ainda não dormira. Mantinha os pés quentes, apesar do inverno que fazia do lado de fora do cobertor. Não conseguia fechar os olhos e relaxar. Parecia que estava com algum estimulante, mas nem uma trepada, nem sequer uma tinha dado. Não trepava há algum tempo. Mas isso também não importava. Há muito não achava o pau ideal. E preferia ter em suas mãos, boca e boceta o pau ideal. Não, qualquer pau não servia.
E ao invés de passar as noites nos bares com as amigas à procura de alguém, matava suas noites em café, chocolate e cerveja, mas esta última só de vez em quando. Só nos momentos em que queria se sentir parte de um mundo normal.
Então o rádio-relógio apitou oito horas e ainda nenhum sono tinha chegado em seus olhos. Pensou que seria melhor se levantar e se vestir para o trabalho, afinal às oito já estava um pouco atrasada. Lembrou-se que era feriado nacional. E o desfile com carros e cavalos, provavelmente estaria, dali a instantes, na televisão. Mas não ligou a TV. Preferiu não ver nenhum cavalo cagando a rua inteira. Preferiu apenas continuar deitada. Por ela, morreria naquela situação. Deitada na cama, sozinha.
A cama não era de casal. Era uma cama de solteiro. E ela sempre preferiu. A cama de casal lhe dava sempre a impressão de estar só. E isso, apesar de se seu desejo, não era muito bom. Gostava de ser a mulher independente e solteira e dona de seu próprio nariz, mas não lhe apetecia a solidão em noites como a anterior, de inverno.
Não suportava ver o relógio de parede caminhar e os pássaros cantarolando felizes apesar do frio, já lhe davam certa agonia. Desejou naquele momento controlar os pássaros e fazê-los calar a boca. Calar o bico, quis dizer. Desejou no instante seguinte que seus vizinhos não conversassem na varanda, que o moço vendedor de pamonha não tivesse nunca comprado aquele megafone e que o rádio-relógio não apitasse a cada hora.
Bom, estava cansada de não conseguir dormir. Ligou a TV. Talvez os cavalos a entretesse. Calçou as pantufas com estampa de cachorro pra aquecer mais ainda do inverno denso que invadia impiedosamente seu quarto. E então, como mágica provocada pelas crianças do coral que, neste momento, na TV, cantavam a música que seu pai costumava cantar antes dela dormir, ela caiu em um sono profundo de mais de quinze horas e não quis saber de mais nada. Nem da saudade do pau, nem da saudade do pai. Nem da vontade de calar os passarinhos, nem de calar a pamonha. Nem na cama de casal ela pensava mais, muito menos na possibilidade de um dia chegar a ter uma. E a TV, ao invés de feriado, anunciava a morte de um cantor lenda do Rock, cuja principal canção embalava o sono da insone moça.
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