terça-feira, 13 de outubro de 2009

Little Girl Blue

Eu queria vomitar no sofá. Eu deixei as revistas jogadas pelo chão. O pedaço de pizza, há três dias, está sobre a mesa de centro. O telefone desligado. A cerveja acabou. A última lata eu bebi ontem enquanto assistia a um filme pornô, muito sem graça, diga-se de passagem. O mundo ainda gira. Meio que sem rumo. Lá fora e aqui dentro também. Janis Joplin canta num vinil velho que eu consegui comprar de um mendigo que ia jogá-lo no mar. Na verdade já é a décima quarta vez que eu coloco o mesmo vinil para tocar em dois dias e meio. Meu vizinho apareceu pra reclamar, dizendo que o fedor do cigarro estava o incomodando. A minha mãe bateu na porta também. Mas eu não a atendi. Ela passou um papel por baixo da porta, era um bilhete dizendo que me amava. Eu só vi depois que acordei. Enquanto eu dormia, sonhava com elefantes no quintal de casa. Eu não tinha um quintal. Eu nunca vi um elefante. Só pela TV. Odeio zoológicos e seus bichos enjaulados. Eles não são felizes. Mas eu ia ao zoológico, de vez em quando, fotografar as emas. Janis Joplin se calou. Acho que está na hora de virar o vinil de lado.

Senti que estava na hora de mais um cigarro, também. Troquei o lado do vinil. Acendi um cigarro e corri pra despensa. Eu estava com fome, eu precisava comer. Tinha macarrão instantâneo. Tinha uma salada na geladeira. Salada com macarrão. Vou pedir outra pizza. Achei uma garrafa de uísque, no fundo da despensa. Pela metade. Eu nem me lembrava que tinha uísque aqui. Na certa, de alguma festa que tinha acabado antes da bebida. Apenas as minhas namoradas iam embora antes da bebida acabar. Há algum tempo não tinha namorada. Correspondia ao tempo exato que aquela garrafa estava guardada. Lembrei que também correspondia, exatamente, ao tempo que eu não trepava. Infelizmente. Eu não gosto muito de prostitutas. Elas não fazem meu lanche depois. Apenas vão embora.

Deitei no sofá. Liguei o telefone. Pedi a pizza. Acendi mais um cigarro e esperei. Tomei uma dose de uísque, sem gelo. Janis Joplin na minha vitrola comprada em antiquário, meu maço de Marlboro, minha garrafa de Jack Daniel’s, agora abaixo da metade, minha pizza por chegar. Um pouco de nostalgia. Um pouco de solidão. Um pouco de embriaguez. E só um pouco de vazio. E mais algumas horas pela frente. Somente o mundo lá fora me perturbava. Mas aqui dentro tudo fluía. Como deveria ser. Desde sempre.

Um comentário:

P. Veras disse...

Fala Daniel, gostei do texto cara não sei bem o que comentar ainda to entrando nesse mundo de blogs srsrs mas gostei muito desse texto. Me lembrei de um livro "Até o dia em que o cão morrreu" é bem nesse estilo! Fizeram até um filme baseado nesse livro " Cão sem dono" assiti o trailer e li a critica me pareceu bom, mas ainda n tive a oportunidade de assiti. Se vc puder ler acho q vc vai gostar o filme qnd eu ver lhe digo se é bom