porque eram todos papéis em verdade. não eram nada bons. não eram nada ruins. eram apenas personagens do grande espetáculo armado pelo destino. e deus o dono do palco, brincando com as vidas, dono da festa e da balbúrdia inteira. quando morreu não sabia se queria mesmo a morte, mas deus, sabido que era, matou-o antes mesmo dele o fazer. deus sabe tudo. até da hora de acabar com a história de alguém. esse deus de vocês é um grandissíssimo fanfarrão. um diretor medíocre. um péssimo ator de si mesmo. um bêbado sentado no meio-fio.
domingo, 13 de novembro de 2011
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
Antônia e Alfredo
Antônia sentou na cama. Era a mesma cama há 50 anos. É claro que havia passado por algumas reformas, alguns riscos feitos pelos filhos, netos, afilhados e sobrinhos que passaram por lá. Nada que tivesse destruído a beleza do móvel de madeira de lei. Era mogno, puro mogno. Umas repinturas em verniz e estava boa de novo. Antônia se orgulhava do presente de casamento de sua já ausente madrinha.
Lembrou nesse instante em que sentava na cama de todas as histórias já passadas naquele quarto. Seus filhos brincando, suas netas escondendo-se do avô debaixo da cama, a empregada que volta e meia tropeçava numa tábua de madeira solta do chão. E riu. Riu da cara de raiva que a empregada sempre fazia resmungando e ameaçando retirar a tábua para nunca mais bater o pé. Ela nunca tirara. E a tábua continuava ali, onde sempre estivera. Agora não fazia mais ninguém tropeçar. Todos já tinham aprendido que não deviam andar por ali ou que deveriam ter cuidado ao passar por ela.
Lembrou-se de outra coisa. Na verdade, se deu conta de como a cama estava fria. No inverno era a única coisa que odiava, ter que deitar na cama fria. Desde que Alfredo morrera, ninguém nunca mais esquentara a cama com ferro de passar antes dela deitar. Para Antônia. era assim que Alfredo provava seu amor por ela, mesmo tantos anos depois de casados. E Antônia se sentiu afagada por sua lembrança. Mas Alfredo não estava mais com ela.
Há sete anos dormia sonhando em acordar do lado de seu amado. Há sete anos nutria a esperança dele buscá-la. Sempre antes de dormir colocava seu vestido azul e o broche que usara no dia de seu casamento. Era como um ritual, um novo sim que dizia a cada noite. Fazia suas preces e incluía nela sempre a memória do marido. Deitava do lado direito da cama e nunca ultrapassava o limite imaginário que existia nesta, que guardava o lado esquerdo para Alfredo. Ainda colocava um punhado do perfume do marido no travesseiro do lado. Toda noite se preparava para recebê-lo.
Na manhã seguinte, Antônia terá realizado seu sonho. Já estará arrumada, pronta para o encontro. E estará tão feliz por isso que as lágrimas dos outros derramadas por sua ida serão em vão. A alegria do reencontro será muito maior que a perda e a saudade que ficarão. Enfim Deus unirá de novo o que por teimosia separou e Antônia e Alfredo poderão viver seus felizes para sempre.
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